O líder chinês Xi Jinping visitou o país esta semana, três meses depois da nação comunista melhorar seus laços com os EUA
O Vietnã está descobrindo que o centro de uma rivalidade entre grandes potências não é um lugar tão ruim para se estar. Atualmente, todos estão se aproximando da nação comunista.
Xi Jinping, da China, se tornou o mais recente líder mundial a estreitar os laços com o país ao fazer uma visita a Hanói nesta semana, três meses após o Vietnã elevar seu relacionamento com os EUA ao mais alto degrau da hierarquia diplomática durante uma visita do presidente Biden.
O Vietnã recebeu Xi com uma saudação de 21 tiros, o nível mais alto para um chefe de estado visitante, quando ele chegou na última terça-feira (12) para a visita de dois dias, a primeira em seis anos.
Os dois lados concordaram em construir uma comunidade Vietnã-China “com um futuro compartilhado, que possui significado estratégico” – linguagem diplomática que indica que, por mais que o Vietnã esteja sendo cortejado pelo Ocidente, ele pretende manter seus estreitos laços políticos e econômicos com o gigante vizinho do norte.
“A China vê a rivalidade dos EUA e, portanto, precisa contra-atacar”, disse Carlyle Thayer, professor da Universidade de New South Wales, em Canberra, e especialista do Vietnã. “O Vietnã tenta obter o máximo que pode de cada um deles.”
Para o país, isso é o que o chefe do Partido Comunista do Vietnã, Nguyen Phu Trong, chama de “diplomacia de bambu”, para descrever as relações externas que são firmemente enraizadas, mas flexíveis.
Há muito tempo, o Vietnã tem um relacionamento próximo, mas às vezes controverso, com a China. Os dois países travaram uma guerra em 1979 e disputaram acirradamente nos últimos anos sobre o que Pequim chama de Mar do Sul da China e Hanói, capital do Vietnã, chama de Mar do Leste.
Nas últimas décadas, o Vietnã esteve próximo da Rússia, seu principal fornecedor de armas. Ultimamente, porém, o país tem procurado diversificar, se aproximando um pouco mais de um círculo mais amplo de países.
Em dezembro do ano passado, a Coreia do Sul tornou-se um parceiro estratégico abrangente, entrando no que era, até recentemente, um clube altamente exclusivo dos amigos mais próximos do Vietnã, como a China e a Rússia.
Os EUA receberam a aprovação em setembro. Em novembro, o Japão entrou para o grupo. Durante uma visita do primeiro-ministro Anthony Albanese no início deste ano, a Austrália disse que também quer participar, e os analistas dizem que é provável que isso aconteça.
Os Estados Unidos estão tentando cada vez mais dar aos fabricantes, principalmente de produtos de alta tecnologia, opções para transferir suas fábricas para fora da China – e o Vietnã é um dos locais para onde as empresas estão voltando as atenções.
O comércio entre os EUA e o Vietnã atingiu US$ 140 bilhões em 2022, mais de sete vezes maior do que em 2010. O aumento foi impulsionado pelas exportações vietnamitas, como eletrônicos e calçados.
O Vietnã, por sua vez, gostaria de ver os laços diplomáticos crescentes com países ricos incentivarem empresas como a Samsung, da Coreia do Sul, e a Apple, dos Estados Unidos, a aprofundar suas redes de produção no país.
O Vietnã precisará aumentar os empregos, a renda e as exportações para atingir a meta de se tornar uma nação de alta renda até 2045, tarefa nada fácil quando seu produto interno bruto per capita é de cerca de US$ 4.000, em comparação com os US$ 80.000 dos Estados Unidos.
Ao mesmo tempo, o Vietnã não pode se dar ao luxo de alienar Pequim: seu vizinho e maior parceiro comercial. Seu comércio total com a China no ano passado foi de cerca de US$ 235 bilhões, de acordo com dados chineses.
Muitos dos produtos que o Vietnã produz para os EUA e seus aliados dependem de matérias-primas enviadas pela fronteira da China. Algumas das empresas localizadas no Vietnã que fabricam peças para dispositivos da Apple são chinesas.
Outra coisa que não passou despercebida pelos Estados Unidos e China: O Vietnã está entre as maiores reservas mundiais de minerais de terras raras, que são essenciais para a fabricação de tudo, desde aviões militares até smartphones. A China domina o mercado de terras raras, mas uma série de empresas está trabalhando para criar cadeias de suprimentos livres do país asiático.
Há outros fatores que impedem o Vietnã de abraçar o Ocidente por completo, incluindo uma alergia à retórica ocidental sobre direitos humanos. O país também vê a necessidade de manter seus laços estreitos com a Rússia.
Embora o Vietnã tenha começado a diversificar as fontes de armas na última década, comprando de países como Israel e Coreia do Sul, poucos países têm indústrias de armas na escala da Rússia.
Não é provável que a China sirva como fornecedor substituto de armas, em parte porque muitos no Vietnã continuam desconfiados de seu poderoso vizinho por causa da guerra de 1979 e da disputa pelo Mar do Sul da China.
A inserção de uma plataforma de petróleo pela China no que o Vietnã considera suas águas territoriais gerou protestos violentos em 2014. Durante a visita de Xi, os dois lados concordaram em manter a estabilidade na disputa.
Em suas conversas com autoridades vietnamitas nesta semana, Xi pediu “mais contribuições para consolidar o apoio popular à amizade entre China e Vietnã”. Em um aceno à ideologia que compartilham, Xi disse que os dois países devem “manter o socialismo sem qualquer desvio”.
Na última quarta-feira (13), o líder chinês prestou homenagem ao líder fundador do Vietnã comunista, colocando uma coroa de flores no mausoléu de Ho Chi Minh.
Apesar das crescentes tensões entre a China e os EUA, o Vietnã parece estar atingindo um equilíbrio – colhendo recompensas tanto da China comunista quanto das democracias de estilo ocidental.
Durante a visita de Biden, os Estados Unidos concordaram em impulsionar o setor de semicondutores do Vietnã por meio do desenvolvimento conjunto de laboratórios de ensino e cursos de treinamento para impulsionar a força de trabalho industrial do país.
Por sua vez, Xi propôs a cooperação em energia verde e minerais essenciais, em um artigo publicado em um jornal vietnamita, paralelamente à sua visita.
“Eles estão administrando a situação muito bem”, disse Nguyen Khac Giang, pesquisador visitante do ISEAS-Yusof Ishak Institute, um grupo de pesquisa de Cingapura. O Vietnã está “tirando proveito de sua posição geopolítica para otimizar os benefícios por meio de uma boa cooperação com a China e os EUA”, disse ele.
O apelo do Vietnã é que ele tem atuação independente e não vai se unir a ninguém, disse Thayer. “E se você não se juntar à festa, vai perder. É uma oportunidade perdida”, concluiu.
(Com The Wall Street Journal; Título original: Why Everyone Wants to Be Vietnam’s Friend)