A economia da China ultrapassará a dos EUA? Alguns começam a duvidar

A forte desaceleração do crescimento da China no ano passado está levando muitos especialistas a reconsiderarem quando os chineses irão ultrapassar os Estados Unidos como a maior economia do mundo – e inclusive se algum dia ultrapassarão.

Até recentemente, muitos economistas acreditavam que o produto interno bruto (PIB) chinês medido em dólares superaria o americano até o final da década, coroando o que muitos consideram a ascensão econômica mais extraordinária de todos os tempos.

Entretanto, as perspectivas para a economia da China estão sendo ofuscadas este ano, visto que as políticas lideradas por Pequim – incluindo a tolerância zero ao Covid-19 e os esforços para conter a especulação imobiliária – minaram o crescimento. 

À medida que reduzem suas previsões para 2022, economistas ficam mais preocupados com as perspectivas de longo prazo do gigante asiático, com dados demográficos desfavoráveis ​​e altos níveis de dívida podendo pesar em qualquer recuperação.

Em uma das revisões mais recentes, o Center for Economics and Business Research, um think tank – instituição de advocacy para políticas públicas – do Reino Unido, acredita que a China ultrapassará os EUA como a maior economia do mundo em 2030, dois anos depois do esperado em sua última previsão, de 2020.

O Centro Japonês de Pesquisa Econômica em Tóquio disse acreditar que a passagem do bastão não acontecerá até 2033, quatro anos depois da previsão anterior.

Outros economistas questionam se a China algum dia realmente alcançará o primeiro lugar.

O ex-secretário do Tesouro dos EUA Lawrence Summers afirmou que o envelhecimento da população chinesa e a crescente tendência de Pequim de intervir em assuntos corporativos, além de outros desafios, o levaram a reduzir substancialmente suas expectativas.

Ele vê paralelos com os prognósticos anteriores de que o Japão ou a Rússia ultrapassariam os EUA – estimativas que parecem ridículas hoje, disse ele. “Acho que existe uma possibilidade real de que algo semelhante aconteça com a China”, disse Summers, agora professor da Universidade de Harvard.

Pesquisadores debatem quão significativos são os rankings do PIB, e questionam as mudanças práticas caso a ultrapassagem ocorra. A expectativa é de que o dólar continue a ser a moeda de reserva mundial nos próximos anos.

Fonte: Shutterstock

O tamanho por si só não reflete a qualidade do crescimento, disse Leland Miller, diretor executivo da China Beige Book, uma empresa de pesquisa. Os padrões de vida americanos, medidos pelo produto interno bruto per capita, são cinco vezes maiores do os chineses, e é improvável que a diferença desapareça a curto prazo.

Ainda assim, uma mudança no ranking seria uma vitória de propaganda para Pequim. Xi Jiping disse a altos funcionários econômicos e financeiros que garantir que a economia esteja estável e em crescimento é importante para mostrar que o sistema de partido único da China é uma alternativa superior à democracia liberal ocidental, e que os EUA estão em declínio político e econômico.

Com o tempo, isso pode gerar mudanças relevantes, à medida que mais países reorientem suas economias para atender aos mercados chineses.

Mas os sentidos podem inverter rapidamente. Em 2020, quando a China se recuperou mais rápido que os Estados Unidos dos surtos iniciais de Covid-19, parecia que a economia do país poderia superar a americana antes do esperado.

Alguns economistas parecem menos preocupados com as ameaças de curto prazo ao crescimento asiático. Justin Yifu Lin, ex-economista-chefe do Banco Mundial, há um tempo otimista com o potencial chinês, argumenta que sua população maior significa que a economia do país acabará duas vezes maior que a dos EUA. Em um fórum em Pequim em maio, ele estimou que o processo continuaria apesar da última desaceleração do país.

No entanto, os problemas econômicos continuam se acumulando, em parte por causa das escolhas políticas que Pequim fez para conter o Covid-19 e controlar a dívida.

A desaceleração imobiliária do país não mostra sinais de abrandamento. Um índice que acompanha a confiança do consumidor caiu para seu nível mais baixo em décadas na primavera deste ano. O desemprego entre os jovens urbanos está em um nível recorde.

O Lowy Institute, um think tank australiano, comunicou em um relatório de março que espera que o crescimento chinês seja em média de apenas 2% a 3% ao ano entre 2021 e 2050, em comparação com as expectativas de alguns pesquisadores de que a China poderia manter 4% a 5% de alta até meados do século. O instituto citou dados demográficos desfavoráveis, retornos decrescentes de investimentos em infraestrutura e outros desafios.

Com o crescimento que estimam, a China ainda pode se tornar a maior economia do mundo, observou o instituto. “Mas nunca estabeleceria uma liderança significativa sobre os Estados Unidos, e permaneceria muito menos próspera e produtiva por pessoa do que a América, mesmo em meados do século”, escreveu. Seu crescimento também não seria suficiente para lhe dar qualquer vantagem competitiva expressiva.

Em resposta a perguntas, o Lowy Institute disse que a maior desaceleração econômica do país desde que o relatório foi divulgado “no mínimo atrasou o provável momento em que a China poderia ultrapassar os EUA, e tornou mais provável que a China nunca seja capaz de fazer isso”.

Medido pelo poder de compra, que leva em conta os diferentes custos de bens e serviços entre os países, Pequim já ultrapassou a economia americana em 2016. Medido em termos de dólares americanos, no entanto, o PIB do país foi 77% do tamanho dos EUA em 2021, acima dos 13% em 2001, mostram dados do Banco Mundial.

Em um relatório no início do ano passado, pesquisadores da Capital Economics escreveram que o cenário mais provável prevê a expansão da economia da China para cerca de 87% do tamanho dos EUA em 2030, antes de cair para 81% em 2050. Eles culparam a redução da população trabalhadora e o fraco crescimento da produtividade, entre outros fatores.

“Várias pessoas por muito tempo superestimaram a competência da liderança da China e ficaram chocadas com os erros com a Covid e o setor imobiliário”, escreveu Mark Williams, economista-chefe da empresa na Ásia, reafirmando a previsão de sua empresa. “A fraqueza que essas crises revelaram está presente e crescendo há muito tempo.”

Alguns pesquisadores dizem que a capacidade da China de ultrapassar os EUA dependerá de ela buscar mais mudanças na política econômica.

Bert Hofman, diretor do Instituto do Leste Asiático da Universidade Nacional de Cingapura e ex-economista do Banco Mundial, disse acreditar que a China pode superar a atual maior economia em tamanho do PIB até 2035, se aumentar sua idade de aposentadoria, permitir que mais trabalhadores rurais mudem para as cidades e tomar medidas para aumentar a produtividade, como gastar mais em educação e saúde.

Mas os chineses não serão capazes de pegar os americanos se os formuladores de políticas buscarem apenas “reformas limitadas”, acrescentou, ou se sofrer uma crise de dívida. Uma maior dissociação com os EUA pode dificultar o avanço da China, já que o fluxo de conhecimento do exterior é interrompido, explicou ele.

Outros economistas temem que as comparações de tamanho possam provocar um nacionalismo prejudicial para ambos os países.

“Muitas pessoas perderam de vista o fato de que nossas economias são mutuamente benéficas”, disse Andy Rothman, estrategista de investimentos da Matthews Asia. Desde que o gigante asiático ingressou na Organização Mundial do Comércio, as exportações dos EUA para a China aumentaram mais de 600%, em comparação com 126% para o resto do mundo, observou ele.

“Olhar para a economia chinesa e a economia dos EUA como um jogo de soma zero não é preciso”, disse.

 

 

(Com Dow Jones Newswire)

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