A ilusão econômica dos políticos

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DISCLAIMER: o texto a seguir trata apenas da opinião do autor e não necessariamente reflete a opinião institucional da Nomos Investimentos ou do TradeNews.

A última quinta-feira (30) foi um dia importantíssimo para a economia brasileira. O ministro da fazenda, Fernando Haddad, apresentou o novo arcabouço fiscal.

Dada a vontade gigante do governo atual de gastar, sob a suposta filosofia de “gasto é vida”, a preocupação do “mercado” (como o povo chama a expectativa mediana dos agentes do mercado financeiro) é quanto a um Lula 3 desembestar a gastar sem limites, mantendo a inflação em alta e obrigando o – agora independente – Banco Central a manter os juros em alta.

Esse cenário certamente seria o pior para nossa economia nos próximos 4 anos.

Então, a nova regra fiscal foi, na média, positivamente recebida. Bolsa subiu, juros e dólar caíram. Reação típica de um “dia feliz” no mercado.

A regra claramente é positiva se comparada com o cenário de nenhuma regra. Não há dúvida alguma disso.

Um feixe de luz, por menor que seja, em uma caverna escura irá iluminar. É como sair do zero e ir para alguma coisa, ainda que essa alguma coisa, quando avaliada em absoluto, seja pouca e/ou tenha diversas falhas.

Foi essa a leitura mediana do mercado – positiva, melhor que nada, mas com pontos importantes a endereçar se a tentativa for realmente fazer a regra funcionar.

Políticos costumam ter uma “tara” pela economia.

O motivo é óbvio: economia em alta é fator fortemente positivo para influenciar a opinião popular e reconduzir o mandatário da vez novamente ao poder nas futuras eleições.

Por isso, políticos se importam extremamente com a economia.

Agora, interessante é ver que a maioria dos políticos brasileiros, principalmente do poder Executivo, creem (ou publicamente demonstram que creem) que são 100% responsáveis pelos caminhos da economia.

Nada mais falso. Não só eles não têm esse poder, como de certa forma, “educam” o povo a crer que eles o têm.

E, ao fazer isso, jogam contra seu próprio interesse de se perpetuar no poder. Irônico, não?

Objetivamente, o governo brasileiro responde por entre 18-20% do PIB nacional. Essa é a fatia de impacto direto do governo na economia.

No mais, quem responde pelo restante da economia são: (i) famílias (consumo interno), (ii) investimentos, (iii) exportações liquidas (mercado externo).

Assim, achar que com 20% de influência direta, você é “O” responsável por esse assunto é um desserviço que os políticos fazem a si mesmos ao propalar essa falsa imagem.

E criam a expectativa nos eleitores de que se a economia está boa, é por seu mérito, e se a economia está ruim, é por sua culpa.

Contribuição para o PIB dos gastos do governo. [Fonte: IBGE]
Obviamente, o governo tem poder de influência sobre a economia, com a participação direta mostrada no gráfico anterior mais a contribuição e fomento as demais áreas (contribuição indireta).

Ter influência sobre algo é diferente de ser COMPLETAMENTE responsável sobre algo.

E, ao se achar mais do que é, acaba-se tomando decisões que vão contra o interesse do país e seus próprios interesses – dando um “tiro no pé”.

Além disso, o governo brasileiro já gasta muito e gasta mal, como colocado num estudo do BID (veja gráfico acima) de março de 2019.

Não é de mais gastos que precisamos, mas de melhor eficiência nesses gastos.

Duas situações muito recentes evidenciam a “esquizofrenia” de achar que os políticos e o Estado são a salvação econômica do país:

(i) briga pública de Lula e seu governo contra os dirigentes do BC, principalmente o presidente Roberto Campos Neto (RCN) e suas condutas;

(ii) arcabouço fiscal apresentado por Haddad.

No primeiro caso, Lula falha ao analisar que RCN é um “infiltrado pelo governo anterior” para jogar contra seu próprio governo ao manter a taxa Selic no patamar de 13,75%.

Lula ignora os problemas da inflação e nosso histórico ruim como país ao lidar com esse fenômeno.

Antes de 1994 (plano Real), o Brasil sofria cronicamente de inflação absurdamente alta e desenfreada.

Em 2003, Lula recebeu a casa arrumada de FHC e não teve que lidar com a necessidade de baixar a inflação, apenas mantê-la em patamares alinhados à meta.

Depois, continuando a ignorar os problemas que a inflação poderia causar, Lula e o PT ligaram a maravilhosa máquina governamental de gastos e elegeram Dilma em 2011.

Gastos do governo continuaram a ser a estratégia econômica principal (“gasto é vida”) mas, como o mundo passou por uma crise brava em 2008-09, a contribuição externa à nossa economia caiu bastante.

A estratégia econômica única terminou no desastre econômico de 2015-16, com o impeachment da presidente.

A inflação era um problema real à população e pode ser considerada economicamente (junto com a queda do PIB) a principal insatisfação à época para suportar politicamente o impeachment.

Cenário de inflação pré-Lula 1. Inflação domada pós-FHC. [Fonte: Economática, IBGE e BC]
Cenário de inflação descontrolada no impeachment de Dilma, em agosto de 2016. [Fonte: Economática, IBGE e BC]
No segundo caso, o arcabouço fiscal apresentado foi basicamente desenhado para se poder gastar mais e, só secundariamente, para se (eventualmente tentar) manter um equilíbrio fiscal.

Essa leitura vem inequivocamente da pretensão, imagem ou avaliação que Lula tem do papel de um governo em relação à economia.

Ao propalar que foi o “melhor presidente do Brasil porque entregou resultados econômicos favoráveis” em Lula 1 e 2, Lula se avoca poderes que não tem.

A economia brasileira entre 2003 e 2010 foi fortemente impulsionada pelo boom de commodities, que gerou um crescimento de arrecadação e suportou o aumento constante de gastos que Lula imprimiu em seu primeiro governo.

A China havia acabado de entrar para OMC em 2001 e cresceu pelos próximos 20 anos a taxas exorbitantes, consumindo nossos produtos de exportação.

O fenômeno chinês explica majoritariamente a maravilha que foi a economia brasileira à época.

Agora vemos a intenção de liberdade de gastos estampada no novo arcabouço fiscal. Coincidência?

A maioria dos economistas de plantão soltaram notas sobre o arcabouço fiscal apresentado e demonstram que “a conta não fecha” (XP) e que “o arcabouço não responde as principais dúvidas” (Professor Giambiagi).

Caro presidente Lula, entenda, não foi sua iniciativa de gastar mais que gerou a bonança. Você influencia sim a economia e a ajuda com iniciativas de cunho econômico.

Mas faça isso sem comprometer nosso equilíbrio fiscal.

Neste caso, o seu interesse pessoal está alinhado ao nosso interesse como país. Faça o que tiver que fazer para estimular a economia, mas sem descuidar da responsabilidade fiscal.

Não caia no engano de fazer a leitura de que ser irresponsável com a inflação não terá custos políticos.

Caso contrário, você corre o risco de ter o mesmo destino que sua colega de partido teve em 2016. Porque em 2003, o mar (mercado externo) estava para peixe. Agora, não está!

Que Deus abençoe seu governo e nos prospere como nação.

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