Brasil tarifado como nunca: quem tem mais a perder?

Por Caroline Galdino, Equipe TradeNews

 

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou que a partir de 1º de agosto entrará em vigor uma tarifa de 50% sobre produtos importados do Brasil, em uma medida unilateral que já gerou reação imediata do governo brasileiro. O impacto direto sobre setores estratégicos como aeronaves, petróleo, celulose e alumínio, somado à incerteza política entre os dois países, levou o mercado a reavaliar o risco Brasil no curto prazo.

Escalada tarifária com viés político

A taxação anunciada por Trump foi justificada como uma tentativa de “nivelar as tarifas entre os países”, mas o contexto indica motivações mais políticas que econômicas. O Brasil é o segundo maior parceiro comercial dos EUA, e setores de alto valor agregado, como o aeronáutico, são os mais expostos. Segundo dados do setor, cerca de 60% da receita da Embraer depende do mercado americano, a fabricante finaliza modelos como o Praetor e Phenom nos Estados Unidos, cujas peças importadas do Brasil agora estarão sujeitas à sobretaxa.

Trump também mirou em questões sensíveis como a atuação do Supremo Tribunal Federal nas Big Techs, a liderança brasileira no BRICS e a retórica de desdolarização defendida no último fórum do bloco que aconteceu no Rio de Janeiro. Nos bastidores diplomáticos, há pressão americana pela abertura do mercado brasileiro a empresas de saúde e etanol.

O presidente Lula reagiu dizendo que, embora busque negociar até a data de vigência, poderá aplicar a lei da reciprocidade: “Se ele quiser cobrar 50% da gente, vamos cobrar 50% deles”.

Participação das exportações para os EUA na receita da Embraer e de outras empresas brasileiras potencialmente afetadas pelas tarifas.
Fonte: Relatórios corporativos

 

Brasil entre retaliação e reposicionamento global

A imposição de tarifas não afetaria apenas o Brasil, mas também teria repercussões sobre a própria economia americana. Muitos dos produtos brasileiros, como o aço e alumínio, são insumos para a indústria dos EUA. A medida ainda pode atingir empresas americanas que operam no Brasil, caso o país adote retaliações, o que elevaria o custo para ambas as economias.

Segundo Pedro Matos, mestrando em Economia Política Internacional da UFRJ, o gesto de Trump deve ser interpretado menos como uma estratégia econômica e mais como um aceno populista à sua base eleitoral. “Não existe racionalidade econômica por trás disso. O governo Trump tenta resgatar uma indústria que foi deslocada há décadas, mas não há competitividade para sustentar essa volta”, afirma.

Matos argumenta que as tarifas fazem parte de uma tática de curto prazo, voltada para fortalecer a imagem de Trump diante de um eleitorado industrial que perdeu poder aquisitivo com a globalização: “Esses trabalhadores, que perderam empregos industriais, são o núcleo duro do trumpismo desde 2016”.

Impactos e oportunidades no xadrez geopolítico

Para investidores, o episódio levanta alertas em duas frentes. A primeira é a possível reprimarização da economia brasileira: setores de tecnologia e valor agregado, como o de aviação, tendem a ser os mais atingidos, o que pode forçar o Brasil a uma dependência ainda maior de exportações de commodities para países como a China.

A segunda é a necessidade de reposicionamento geopolítico. “O Brasil precisa buscar alternativas e não depender exclusivamente nem dos EUA, nem da China. O cenário internacional está em mudança e pode ser uma oportunidade para diversificar alianças estratégicas”, pontua Matos. Ele afirma ainda que, apesar da retórica firme, o governo Lula tem demonstrado equilíbrio na política externa, conseguindo dialogar com diferentes potências.

Ainda há margem para negociação até 1º de agosto. Caso Trump recue, como já fez em outras ocasiões, o mercado poderá interpretar o episódio como mais um teste diplomático. Por ora, investidores devem observar com atenção os desdobramentos e avaliar os riscos setoriais, especialmente em empresas como Embraer, CSN, Vale e demais exportadoras com forte presença nos EUA.

 

O texto trata apenas da opinião do autor e não necessariamente reflete a opinião institucional da Nomos Investimentos ou do TradeNews.

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