O dólar à vista opera em queda pela terceira sessão seguida nesta quinta-feira (13), com mínima em R$ 4,89 – menor patamar intradiário desde junho. Mesmo com o Ibovespa realizando lucros após três dias de alta, o câmbio brasileiro segue em valorização.
A apreciação da divisa brasileira resulta de uma convergência de três fatores que se desenrolam já há duas semanas, segundo Beto Saadia, diretor de investimentos da Nomos.
O primeiro motor é a tramitação do novo arcabouço fiscal em Brasília. O mercado estava ansioso ante a primeira apresentação do texto, comentou Beto, em meio à dúvida quanto ao apoio do governo à proposta do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
Nos últimos dias, porém, Lula “sinalizou positivamente um apoio muito forte para o arcabouço”, o que deve ajudar na passagem do texto pelo Congresso, prossegue o especialista.
Uma vez amenizada a ansiedade quanto à política fiscal do Brasil, houve espaço para reações expressivas aos indicadores de inflação desta semana.
“Dado o progresso no front fiscal e na inflação, é provável” que o dólar permaneça abaixo de R$ 5 em vez de ir acentuadamente acima desse nível, segundo os estrategistas do Banco Bilbao Vizcaya Argentaria (BBVA) escreveram em relatório. “A partir daqui, dólar a R$ 4,90 é o próximo nível.”
Cochilo do dragão
Dados de inflação do Brasil e dos EUA são o sustento mais imediato ao impulso do real, sendo o índice de preços ao produtor (PPI) americano o indicador mais recente.
A taxa mensal do indicador caiu 0,5% em março ante fevereiro, ao contrário da projeção de estabilidade. No confronto anual, o PPI subiu de 2,7% em março, desacelerando em relação ao acréscimo de 4,9% observado em fevereiro.
Na quarta-feira (12), o índice de preços ao consumidor (CPI) dos EUA surpreendeu com a menor taxa anual em quase dois anos, de 5%.
Mas o primeiro sinal de alívio da pressão inflacionária veio daqui. Divulgado na terça-feira (11), o IPCA de março teve alta de 0,71%, abaixo da projeção, de 0,77%.
Adicionalmente, os fatores que impulsionaram os preços para cima “foram os pontos que a gente chama de inflação de canetada”, comentou Beto Saadia. As contribuições para o avanço do IPCA vieram principalmente da energia, por conta da reoneração do ICMS.
Ao invés de ser uma inflação difusa, os preços subiram principalmente por conta dos preços de energia. “A gente espera que isso seja pontual, ou seja, isso não se repita ao longo das próximas divulgações de IPCA”, acrescenta Beto.
A variação de 12 meses da inflação brasileira ficou quase 1 ponto percentual abaixo do registrado em fevereiro, saindo de 5,6% para 4,6% – mais perto da meta do Banco Central, o que reacendeu projeções mais imediatas de corte da Selic.
A precificação de corte da Selic em junho superou 14 pontos ontem, segundo a Bloomberg.
A faca e o queijo
A mistura de três indicadores de inflação bem-recebidos com uma proposta e arcabouço fiscal para o Brasil resultaram na precificação de apostas de cortes de juros, principalmente nos EUA.
O monitoramento do CME Group mostrava nesta manhã uma queda na chance de uma alta de 0,25 ponto percentual pelo Federal Reserve (Fed) em sua próxima reunião, no início de maio, a 61,9%.
Logo antes da divulgação do PPI americano, ela estava em 68,5%, e ontem estava em 70,4%.
O fortalecimento da projeção de um cenário de juros mais leve também se apoia na “quebradeira geral de bancos”, como definiu o diretor de investimentos da Nomos. “Essa instabilidade de liquidez bancária fez com que o próprio FED enxergasse uma trajetória menor da inflação”, comenta.
Também há o fator dos dados de mercado de trabalho dos EUA. O último payroll trouxe um número abaixo do previsto de geração de empregos. De acordo com Beto Saadia, o indicador pode surtir “uma expectativa melhor de geração de um maior desemprego, que pode pressionar menos os salários e ajudar o cenário de inflação por lá”.
Se o Fed estancar de fato o aperto monetário dos EUA, a tendência é de atração de capital para o Brasil. A projeção depende muito do andamento do arcabouço fiscal, frisou Beto.
“O Brasil, a partir do momento que vai fazendo esse dever de casa, do ponto de vista fiscal, se mostra ao mundo como um país minimamente solvente, com a maior ou com uma das maiores taxas de juros do mundo.”
A consequência mais óbvia é atração de capital para o país – seguida por valorização da moeda brasileira em detrimento da americana.