Dos EUA ao Brasil, o que de fato aconteceu com as small caps?

O índice americano Russell 2000 – que representa as duas mil menores empresas listadas no índice de Wall Street Russell 3000, no que diz respeito à capitalização de mercado – atingiu, na última sexta-feira (20), seu menor patamar desde maio do ano passado. O index vem performando bem aquém de seus tempos áureos, no final de 2021. 

Segundo Bruna Allemann, head de mercado internacional da Nomos, o atual cenário macroeconômico dos EUA é o total oposto do ambiente ideal para uma small cap crescer. Os custos de crédito seguem altos, assim como as taxas de juros, limitando a expansão dos negócios e o investimento em operações. 

O analista Gerson Brilhante, da Levante, indica que a fraca performance do Russell 2000 reflete o momento de desaceleração econômica americana. Além disso, ele explica que as small caps americanas, diferentemente das big e mega caps, têm menor capacidade de refinanciamento de dívida e geração de caixa, tornando-as mais sensíveis às taxas de juros. 

Brilhante frisa que esta necessidade por refinanciamento não era tão comum alguns anos atrás, mas que as companhias precisam enfrentar um mercado mais rígido e com menos acesso ao crédito. 

“Esse cenário mais restritivo certamente foi o que mais contribuiu para o desempenho mais fraco do Russell 2000”, sinalizou Bruna Allemann. 

“Mas vale lembrar que nunca é apenas um motivo que leva determinado mercado a se movimentar. As ações em geral são voláteis por natureza, mas podem sofrer impactos de várias formas, em maior ou menor proporção, dependendo do tamanho do problema e conjuntura”, contrapôs.

A especialista da Nomos listou algumas das outras possíveis razões para o desempenho fraco das small caps americanas em 2023, como a volatilidade do mercado global, as tensões geopolíticas, condições do mercado de crédito, preços das commodities e desafios setoriais. 

Para Allemann, o futuro das small caps dos EUA está diretamente ligado ao do país e ambos, por ora, parecem incertos. Ela destaca a iminente recessão americana que parece nunca chegar, mas que a cada decisão de política monetária do Federal Reserve (Fed) parece estar mais próxima. 

“Então, temos um [primeiro] momento: recessão, momento de ter posições em renda fixa global, ações de valor, queda nos preços das empresas mais voláteis”, afirmou. Após isso, diante de uma recuperação, as small caps podem se encontrar em um ambiente melhor com o eventual fim da alta de juros nos EUA e oportunidades mais atrativas surgindo. 

As empresas

Brilhante citou a Olaplex – desenvolvedora de produtos capilares – e a Crocs – empresa de calçados – como as grandes decepções entre as small caps dos Estados Unidos. De acordo com o analista, a primeira sofreu uma queda significativa após clientes abrirem processo contra a empresa em fevereiro deste ano, afirmando diversos danos que seus produtos fariam à saúde. 

No fechamento mensal, a companhia só não teve fechamento negativo em janeiro e junho. Já a Crocs, ainda que tenha fundamentos sólidos, sofre uma queda de 20% em 2023, segundo Brilhante. 

Em reportagem, a Forbes indicou que a small cap que mais sofreu no primeiro semestre de 2023 foi a WeWork – que oferece espaços físicos e virtuais de coworking. A Bloomberg mostrou que em agosto deste ano a companhia havia declarado duvidar de sua capacidade de seguir operando. 

“O modelo de negócios da ACM Research gira em torno da produção de equipamentos de processamento de materiais avançados para a indústria de semicondutores, com foco na inovação tecnológica, expansão global e parcerias estratégicas. A empresa teve uma alta de 82% até agora, enquanto o Russell 2000 cai 2,7%”, expôs. 

Já a AppLovin se concentra em facilitar a publicidade móvel eficaz, na monetização de aplicativos e jogos e no desenvolvimento de jogos para dispositivos móveis, focando em tecnologia, análise de dados e parcerias estratégicas, indicou o analista. Segundo ele, a empresa teve uma alta de 82% até o momento no ano. 

A Forbes indicou a Bit Digital como principal ganhadora do primeiro semestre de 2023.

No Brasil

As small caps brasileiras têm tido comportamento bem volátil em 2023, indica Eduardo Rahal, analista da Levante. Em março, o índice SMLL – composto por empresas de menor capitalização no Brasil – apresentou performance negativa de cerca de 10%. Já em agosto, depois do início do corte de juros do Banco Central, o indicador registrou ganhos de 22%. 

Para o analista, depois do início do afrouxo monetário no Brasil, o mercado passou a ficar mais exigente em relação aos dados econômicos e a se atentar à situação fiscal do país. Outro fator que começou a ser observado foi a falta de sintonia entre os bancos centrais, ressalta Rahal, evidenciando o diferencial de juros em relação aos EUA. 

“Seguimos com uma cabeça ‘cautelosamente otimista’ para as small caps”, declarou. Valuations mais atrativos, os descontos ante à média histórica dos papéis e mais quedas de juros no horizonte refletem positivamente nessas empresas, mostrou o analista. 

Entretanto, o fator diferencial de juros ante os EUA reverberando no câmbio, incertezas fiscais e os juros americano diminuindo a liquidez dos mercados pesam no lado negativo da balança para as small caps, de acordo com o especialista. 

Entre as small caps brasileiras que se destacaram positivamente em 2023, ele cita Kepler Weber [KEPL3] e Sanepar [SAPR11], as quais apresentaram ativos com performances “bem acima da média”, enquanto o índice SMLL está “praticamente zerado no ano”.

No lado negativo, a 3R Petroleum [RRRP3], a Infracommerce [IFCM3] e a Locaweb [LWSA3] tiveram desempenhos “significativamente inferiores”.