Quadro fiscal brasileiro, e não exterior incerto, é o potencial maior empecilho na aceleração dos cortes de juros

O Comitê de Política Monetária (Copom) vai anunciar na próxima quarta-feira (01) o futuro da taxa de juros do Brasil. Um novo corte de 0,5 ponto percentual na Selic é a expectativa das fontes consultadas pelo TradeNews, conforme o projetado pelo Comitê na reunião de setembro. Dessa forma, a Selic chegaria a 12,25%.

Até o mês passado, o mercado tinha expectativa de aceleração nos cortes da Selic. Entretanto, com as incertezas do mercado externo, principalmente a alta histórica de juros e shutdown nos Estados Unidos e a guerra entre Israel e Hamas, essa expectativa morre, de acordo com Beto Saadia, diretor de investimentos da Nomos.

“Quando há uma taxa de juros no exterior mais forte, aqui há um fluxo de dinheiro saindo e o dólar mais forte também, que acaba fazendo com que o Banco Central brasileiro não consiga reduzir tanto os juros assim”, explica Saadia.

Marco Ferrini, analista de macroeconomia da Benndorf Research, aponta o comprometimento com a questão fiscal brasileira como outro principal fator que pode contribuir para cortes mais acentuados dos juros, algo que até o momento ainda é bastante incerto. 

O quadro fiscal brasileiro também havia sido citado como preocupação na ata da última reunião. 

Ferrini destaca a declaração de Lula feita na última sexta-feira (27), quando o presidente afirmou que a meta do déficit fiscal “não precisa ser zero” em 2024. 

“É preocupante para o risco fiscal brasileiro e vai na contramão do que o Ministério da Fazenda havia planejado e apresentado como cenário factível no começo do ano, colocando em xeque o comprometimento das autoridades nacionais com a questão fiscal”, declarou o analista.

Considerando que ainda é cedo (ou não) para observar os impactos concretos das falas do presidente sobre as metas fiscais, ela gera uma pequena piora do ponto de vista reputacional, segundo Maykon Douglas, economista da Highpar.

“Não é novidade que esse breakeven dificilmente ocorrerá em 2024 nas atuais condições; porém, sugerir que a meta poderia ser deliberadamente “ignorada” abranda a própria robustez do objetivo e a reancoragem das expectativas de inflação, que ainda não se encerrou”, argumentou o economista. 

Desde agosto, quando começaram alguns rumores sobre a alteração da meta de resultado primário no âmbito do novo arcabouço fiscal, o consenso de mercado para o primário em 2024 gravita ao redor de -0,8% do PIB. 

De acordo com Maykon, apesar do avanço no pacote de medidas pró-arrecadação, boa parte pode delas sofrer judicialização – como no PL do Carf e na mudança na tributação de benefícios fiscais de ICMS – ou se desidratarem no Congresso – caso da taxação de exclusivos e offshore –, além de uma possível subestimação das despesas previstas no Orçamento. 

“Os parlamentares apresentam uma postura mais ‘emancipada’ e os partidos de centro buscam mais cargos no governo, que não vêm na velocidade desejada. Isto arrefece a articulação em alguns momentos e se torna um obstáculo a mais, elevando os custos políticos”, afirmou.

Ele diz que as condições para tal cenário desafiador já pareciam dadas antes da última ata, e o que temos visto é a concretização deste. No próximo comunicado, “O BC deverá reiterar a necessidade de “firme persecução” dessas metas e, neste caso, as palavras do governo valem mais do que parece”, concluiu o economista.

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