“Boa Sorte Day” foi o nome posto por participantes do mercado financeiro à última quinta-feira (10), quando o Ibovespa recuou 3,35% em reação de investidores ao discurso do presidente eleito, Lula. Ademais do mercado de ações, a renda fixa também experimentou volatilidade ante as promessas de mais gastos do Governo Federal a partir de 2023.
“Os juros futuros subiram muito porque o mercado acreditou que a política econômica do novo governo vai ser fiscalmente irresponsável”, pontuou Leandro Vasconcellos, head da mesa de alocação da BRA BS/. A taxa DI com vencimento em 2027 teve a variação mais expressiva do dia, com 10,34% de alta.
“Sempre que acontece alguma ameaça a qualquer tipo de instituição, seja democrática, no caso das urnas, ou, por exemplo, da âncora fiscal que a gente tem, ou ainda mais da meta de inflação”, comentou Beto Saadia, planejador financeiro e especialista em alocação e fundos de investimentos da BRA/ BS, “você na verdade tem uma aversão ao aumento de aversão ao risco, e isso se traduz diretamente no dólar”.
A moeda americana é costumeiramente utilizada como hedge por brasileiros e estrangeiros. Dado o efeito do câmbio no aumento da inflação, a perspectiva de juros elevados por mais tempo se acentua.
“Não necessariamente os juros vão subir”, frisou Beto. Mas elevou-se a projeção de que “os juros talvez não caiam tão cedo, ou talvez eles fiquem no patamar que está, que já é muito alto, durante muito tempo”. Dessa forma, “os juros futuros, principalmente os vencimentos mais longos, subiram, e subiram bastante”.
Quando os juros futuros aumentam, “o mercado está sinalizando o seguinte: ‘a política que está sendo adotada hoje, eu não pago, eu não compro o título público no preço que está’”, ilustra Leandro. O especialista lembra que o mercado é o financiador do endividamento do governo, através da compra dos títulos de dívida, os títulos públicos.
A expectativa de juros mais altos traduz a famosa exigência do mercado de maiores retornos por maiores riscos. “Quando você tem um governo que gasta irresponsavelmente, que aumenta muito o seu nível de endividamento, é natural que aquele que está emprestando dinheiro passe a cobrar mais por isso”, prossegue Leandro Vasconcellos.
Efeitos no Tesouro Direto
Investidores mais atentos podem ter percebido a variação de preços dos títulos do Tesouro Direto durante o Boa Sorte Day. Tal se deu porque os juros futuros são a projeção do preço dos títulos na data do vencimento.
“Se eu tenho um contrato de juros futuros para 2029 pagando 13%, eu não aceito que o título do governo seja menos do que isso”, exemplifica o head de alocação da BRA BS/. “Quanto maiores os juros futuros, mais altas serão as taxas dos títulos do Tesouro Direto”.
Oscilações como a de quinta-feira significam perda para quem já tinha títulos pré-fixados em carteira, apontou Beto Saadia. O investidor “provavelmente perdeu dinheiro, e é possível ainda que [o título] fique abaixo do CDI até o vencimento”. Uma vez que os juros futuros subiram, os contratos anteriormente comprados — a taxas mais baixas — se desvalorizaram, por oferecerem retorno menor.
Por outro lado, comenta Beto, o preço ficou melhor para quem ainda não tinha títulos em carteira. “Comprar o título mais barato significa ter uma rentabilidade até o vencimento maior.”
Nem todos os então detentores de títulos do Tesouro Direto auferiram perdas no Boa Sorte Day. “Para quem tinha o pós-fixado, nada muda e nunca vai mudar”, enfatizou o especialista. “O pós-fixado não tem componente especulativo. Se a taça Selic subir. ele vai ganhar mais, se a Selic cair, ele vai ganhar menos.”