Lula x Campos Neto: Ameaça real ou cortina de fumaça?

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, participa de audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado

DISCLAIMER: o texto a seguir trata apenas da opinião do autor e não necessariamente reflete a opinião institucional da Nomos Investimentos ou do TradeNews.

Jogos de cena, cortinas de fumaça, traições, chantagens e outras artimanhas nefastas são muito comuns na política.

Lembro-me da normalidade com a qual um empresário muito influente na política carioca me disse, 15 anos atrás, que a atividade política no Brasil demandava “flexibilidade de caráter”, como se isso fosse um selo de distinção que credenciasse alguém para a atividade.

Desde que começaram os ataques mais recentes ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, tenho recebido questionamentos sobre o potencial destrutivo dessas investidas e suas implicações para a nossa economia.

É óbvio que todas as ações de um governo têm sempre uma conotação prática e outra política e, já respondendo ao leitor mais apressado, sim! Essa guerra é uma cortina de fumaça! Porém é também uma ameaça bem real!

Pelo lado político, a cortina de fumaça tem como um dos objetivos mais óbvios encontrar um culpado pelo provável fracasso econômico do governo, uma vez que 2023 será muito diferente de 2003, quando Lula fez seu primeiro mandato com todo vento a favor.

Em 2003, internamente tínhamos inflação sob controle, baixo endividamento e alta capacidade de fornecer commodities.

No cenário externo, tínhamos um ambiente sem guerras, uma China crescendo dois dígitos por ano e consumindo vorazmente tudo que era produzido no mundo e impulsionando o crescimento econômico mundial.

A China responde por cerca de 30% do crescimento global. [Fonte; Pixabay]

Em 2023 temos o exato oposto, e, antes que o eleitor menos esclarecido perceba que a glória do passado teve mais a ver com o cenário externo favorável do que com a competência técnica do governo, e que na realidade nós nem aproveitamos tanto assim esse vento a favor, já que nesse período crescemos abaixo da média mundial, é politicamente necessário que se forjem culpados ao longo do caminho.

Recentemente, aliás, o ex-presidente Jair Bolsonaro foi apontado como “culpado” pelo calote de Cuba no BNDES, que aconteceu em 2018, antes mesmo de seu mandato começar. Paciência! Política é assim.

Um outro possível ganho político, e esse ainda mais perigoso, é a cooptação da opinião pública para a normalização da inflação.

Recentemente o presidente afirmou com todas as letras que inflação baixa no padrão europeu não é ideal para o Brasil, deixando claro seu objetivo de ter uma meta de inflação na casa dos 5% ao ano, em vez dos atuais 3,25%.

Caso a grande mídia embarque nessa e consiga ampliar a mobilização, temos riscos reais de seguirmos pelo caminho da Argentina e perdermos o controle da inflação. Isso aliás já aconteceu antes, na era Dilma, quando a inflação atingiu 2 dígitos.

Pelo lado prático, o cenário é ainda pior, pois pode trazer reveses ao governo e ao país, posto que as atuais investidas de Lula podem ter o efeito oposto ao que se pretende alcançar.

Os ataques irresponsáveis a Campos Neto afugentam os investidores internacionais e expõem ao mundo nossa fragilidade institucional, insegurança política e jurídica.

Ninguém lá fora com mais de dois neurônios investiria a longo prazo em um país em que as regras mudam a toda hora, e, isso contribui para a fuga de capitais, aumento do dólar e consequentemente aumento da inflação, que no fim acarreta em aumento dos juros.

Na prática o desejo do governo é ter uma meta de inflação maior para que possa emitir mais dívida e jogar dinheiro na economia gerando a falsa sensação de crescimento, enquanto a inflação corrói o poder compra da população mais pobre. Nada de novo debaixo do sol. Isso já foi feito antes e deu errado!

Aliás, essa receita deu tão errado que culminou no impeachment da presidente Dilma, quando, diante do caos econômico, perdeu completamente sua sustentação política e foi deposta antes do colapso total da economia, que foi evitado aos 45 do segundo tempo pelas reformas do governo Temer, entre elas, o teto de gastos. Ufa! Aquela foi por pouco!

A ex-presidente Dilma Rousseff sofreu impeachment em 2016, sob acusação de crime de responsabilidade. [Fonte: José Cruz/Agência Brasil]
Com um vice assim tão bem relacionado com o setor produtivo como Alckmin e um Congresso tão alinhado ao bolsonarismo, acho bem arriscada essa estratégia do governo.

Mas calma! Antes que você entre em pânico e queira pular da primeira janela à sua frente por conta dessa maluquice, lembre-se que no mercado financeiro é possível ganhar dinheiro em qualquer cenário, e toda essa bagunça não quer dizer que seus investimentos irão mal. Pelo contrário, significa apenas que você precisa ajustar as velas do seu barco.

Por mais que me doa escrever isso, o cenário não é ruim para quem investe, ele é sim muito ruim para as camadas mais pobres da população.

Quem ganha pouco, gasta 100% do salário para sobreviver e não investe está praticamente condenado a permanecer na pobreza por mais tempo.

A inflação implacável impede, em última análise, a ascensão social.

Mas, para quem tem capacidade de geração de receita e investe regularmente, este é um momento singular, no qual é possível obter altos ganhos, principalmente na renda fixa.

Lembro-me como se fosse hoje quando, no governo Dilma, tínhamos títulos de renda fixa pagando mais de 18% ao ano.

Com taxas de juros nesses níveis, era possível dobrar o capital investido a cada quatro anos!

Bom para quem tem investimentos, péssimo para quem não tem!

Quem diria que, no fim, as principais medidas propostas por um governo eleito com base em seu discurso pela causa social ampliam a desigualdade, mantêm o pobre na pobreza e consolidam os mais ricos no Olimpo dos rentistas.

Como dizia Antônio Ermírio de Moraes, “Política é a arte de pedir o voto dos pobres, o dinheiro dos ricos, e mentir para ambos”.

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